Painéis de Alberto Pereira chamam a atenção para diferenças sociais
Por Leonardo Sodré
NITERÓI - O empreendedorismo creditado à geração Y, à qual pertencem os nascidos do início dos anos 1980 até meados da década de 1990, pode se manifestar de diferentes formas. No caso do publicitário Alberto Pereira, de 29 anos, que passou a infância no Barreto, as adversidades serviram como fonte de inspiração e o colocaram no caminho da arte. Depois de perder o emprego, em 2015, e passar a rodar a cidade como motorista de Uber até o ano passado, ele resolveu fazer colagens em tapumes a partir de imagens instigantes, com forte conteúdo político, que abriram um novo leque de possibilidades para suas criações.
A repercussão do seu trabalho tem sido cada vez maior: a série #NegroNobre, em que recria imagens de personalidades negras construindo retratos com estética renascentista do século XVI por meio de computação gráfica, faz sucesso no Instagram e ganha elogios dos ilustres representados.
O projeto #NegroNobre foi iniciado em 2015 com uma série de 40 retratos. Na época, teve boa repercussão e levou Pereira a entregar pessoalmente suas criações a figuras como a cantora Sandra de Sá e o rapper Emicida. O artista conta que resolveu retomar o trabalho agora, em razão dos 130 anos da abolição da escravatura.
— O movimento de afirmação da importância da cultura negra no país ganhou mais força e trouxe outras questões importantes como a liberdade de gênero. Senti a necessidade de homenagear, também, pessoas que ficaram conhecidas nesse período, como as cantoras Liniker e Linn da Quebrada e o rapper Rico Dalasam — afirma Pereira.
Na nova fase, ele já retratou o ator, bailarino e comediante Jorge Lafond, o percursionista Naná Vasconcelos e os atores Aílton Graça e Ruth de Souza, entre outras personalidades:
— Para finalizar, farei dez pessoas importantes que já se foram. Entre elas, a vereadora Marielle Franco.
PHOTOSHOP CRIATIVO
Para criar os retratos, Pereira usa o editor de imagens Photoshop e modifica as roupas e a aparência dos fotografados.
— É bem difícil encontrar uma foto que se encaixe perfeitamente no conceito. Além de a posição do rosto ter que estar de acordo, a luz é importante. Algumas pessoas eu deixo de fazer por não encontrar foto adequada para trabalhar — lamenta.
O trabalho de Pereira não envolve só celebridades. Um olhar mais atento de quem passa pelas ruas de Icaraí pode identificar colagens feitas por ele em tapumes que retratam pessoas comuns em cenas com tom de crítica social. Nos compensados que isolam uma obra na Rua Tavares de Macedo, próximo à esquina com a Pereira da Silva, um de seus trabalhos traz a figura de Nossa Senhora com um Menino Jesus negro no colo. A obra, chamada de “Jesus pretinho”, já foi espalhada pelo artista em diversos locais da cidade e até nas lixeiras que ficam nos acessos às areias de Itacoatiara.
Na Rua Moreira César, ele colou um cartaz em que um homem negro com o semblante concentrado, fazendo esforço, carrega o símbolo matemático de “diferente de”, ao qual está acorrentado. A delicadeza das formas e a contundência das mensagens compõem a dicotomia perseguida por Pereira.
— Tem gente que trabalha na rua e só quer colocar cor. Por mais que eu prefira o colorido ao cinza das ruas, sinto a necessidade de propor algo além, que gere uma reflexão. Busco criar imagens singelas, mas que fazem pensar: é como dar uma porrada e um carinho ao mesmo tempo — resume.
O sucesso das obras de Pereira tem chamado a atenção de empresas e gerado boas oportunidades. Atualmente, ele prepara um grande painel para a fachada da obra de um edifício em construção na Praia de Piratininga, a pedido da construtora responsável.
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